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Destaques

✢ LANÇAMENTO: LIVRO "CALVINO, CIÊNCIA E FAKE NEWS"

  Não é sem imensa expectativa e alegria que se empreende a publicação da décima primeira obra de caráter temático calviniano da Série Calvino21 , sob autoria do Rev. J. A. Lucas Guimarães, historiador, teólogo e organizador do Calvino21 , intitulado  CALVINO, CIÊNCIA E FAKE NEWS:  a invenção da oposição calviniana à Ciência moderna na historiografia do século XIX.   Principalmente, ao considerar a singularidade do conteúdo, o nível do conhecimento alcançado e o caráter da percepção do passado envolvida, disponibilizados à leitura, reflexão e intelectualidade, caso o arbítrio do bom senso encontrado, esteja em diálogo com a coerência da boa vontade leitora. Com a convicção da pertinência da presente obra ao estabelecimento da verdade histórica sobre a postura de João Calvino (1509-1564) diante dos ensaios preparatórios no século XVI  ao início da Ciência Moderna ocorrido no século XVII,  representado por Nicolau Copérnico (1473-1543) com sua teoria do movimento da Terra ao redor do Sol

✢ CALVINO FOI VÍTIMA DA PRIMEIRA FAKE NEWS MODERNA

J. A. Lucas Guimarães | Calvino21 *

Dos muitos estigmas gerados em torno da pessoa de João Calvino, consta aquele que o evoca como ferrenho opositor da ciência moderna. Sobre essa questão, Reijer Hooykaas, professor holandês de História da Ciência, ressalta: “Aqui, mais uma vez, o preconceito cegou os historiógrafos.” Segundo Richard Stauffer, professor e historiador suíço, foi Andrew D. White, primeiro reitor da Cornell University, no final do século XIX, quem afirmou no livro A History of the Warfare of Science with Theology in Christendom (1896), que João Calvino, ao comentar o Salmo 93.1, fez uso de exclamação que revela sua oposição a Copérnico, citada em uma de suas argumentações, a seguir:

Enquanto o luteranismo condenava assim a teoria do movimento da Terra, outros ramos da Igreja Protestante não ficaram para trás. Calvino tomou a dianteira, em seu Comentário sobre o Gênesis, condenando todos os que afirmavam que a Terra não está no centro do universo. Ele encerrou o assunto com a referência usual ao primeiro versículo do salmo noventa e três e perguntou: “Quem se aventurará a colocar a autoridade de Copérnico acima da do Espírito Santo?”

No entanto, essa informação de White é fake news historiográfica. Ao comentar o Salmo 93.1, João Calvino não fez tal referência e nem é encontrada em nenhuma parte de seus escritos. A respeito dessa falácia, Hooykaas dá ciência que durante quinze anos registrou que João Calvino jamais fez citação a Copérnico, mas “a lenda é difícil de acabar”, destaca ele. Portanto, é questionável o fato do filosofo Bertrand Russell, na obra História da Filosofia Ocidental, repita o argumento de A. D. White, sobre a exclamação anticopernicana de Calvino, sem se oportunizar à pesquisa bibliografica, mesmo sob possibilidade de acesso ao seu original. Segundo Russell, após sua análise da citação de escrito luterano combativo a Copérnico:

Calvino, igualmente, demoliu Copérnico com o texto: “O mundo está bem estabelecido, de modo que não pode ser movido” (Salmo XCIII, I), e exclamou: “Quem se atreverá a colocar a autoridade de Copérnico acima da do Espírito Santo?”

Com essa postura anticientífica, Russell tornou-se o principal divulgador dessa vergonhosa falácia, forjada em caráter de cientificidade, mas desprovida dela. Edward Rosen, que na década de sessenta do século XX envolveu-se em vários debates em torno dessa temática, é de opinião da dificuldade de não buscar saber o motivo da omissão da pesquisa documental por Russell, ao qual sugere que:

Negar nossa indulgência a Russell, certamente seria descortês. No entanto, é difícil reprimir o sentimento de curiosidade despertado por sua tentadora omissão de suporte documental à exclamação anticopernicana de Calvino. Eu, pelo menos, como estudante do início da ciência moderna, ficaria feliz em saber exatamente quando Calvino exclamou contra Copérnico.

No entanto, parece que Russell não abriga semelhante curiosidade científica. Contudo, sua postura não se mostra em condição de isolamento entre os cientistas renomados. Esse também foi o caminho percorrido por Thomas Kuhn, historiador da Ciência, em sua obra A revolução copernicana, ao seguir fonte secundária, propriamente referenciada à obra de Andrew D. White, acima citada. Pode-se, portanto, também questionar a disposição de Kuhn em eleger pesquisa nessa obra e de seu impedimento em empreender verificação diretamente no original do texto pretendido à citação, o Comentário ao Livro dos Salmos de João Calvino, evitando uso de fonte secundária. Se a obra original se encontra disponível, a preferência por fonte secundária pode indicar desinteresse à devida referência da fonte original ou o intento de redução no empenho à pesquisa pela elaboração da referência bibliográfica com as obras disponíveis à facilidade do momento. Se a obra de White está à disposição na biblioteca, parece sem sentido a procura da fonte original que, aparentemente, não se encontra disponível. Por certo, não será necessário nem verificar a existência dela. A confiabilidade autoral da fonte secundária é garantia à citação e à devida argumentação. Tem-se o suficiente: uma obra autoral com a informação, que se intenta à elaboração da concepção idealizada à estigmatização do outro, como adversário da boa causa do objeto da pesquisa. Portanto, Kuhn tem diante dele uma obra autoral, que detém prova da postura negativa de Calvino à teoria copernicana. Como defensor da ciência, objeto de sua pesquisa, é convencido a divulgar a informação em nome da valorização da ciência e de todos os vitimados pela intolerância nos primórdios dela. Dessa forma, nem se dar ao trabalho de comentar ou participar com novas informações, mas apenas faz publicidade da fake news de White sobre Calvino através da pesquisa e, posterior, publicação dela. Essa foi a postura anteriormente adotada por Russell, quando também apenas passou adiante a mesma falácia, dada a aparente credibilidade de sua autoria.

É admirável como Andrew D. White utiliza no final do século XIX da mesma lógica da atual propagação de fake news nas redes sociais. Ele estabeleceu um texto com informações falsa sobre Calvino e o divulga através da publicação da obra. Dada a credibilidade autoral, outros passam adiante o conteúdo do texto sem questionar ou procurar verificar a veracidade da informação, como se pode verificar em Russell e Kuhn. Nisso, espalha-se a maculação à pessoa de Calvino, como combativo ferrenho à ciência moderna no século XVI. É fojado até um pseudo-escrito calviniano, pelo qual se verifica a sua postura danosa à cientificidade moderna. No entanto, é apenas fake news do historiógrafo, primeiro desse tipo conhecido, comprovadamente, no campo historiográfico e de resultado plenamente efetivo em se proliferar, vincular-se, fazer-se verdade e estigmatizar duradouramente o envolvido na falácia informada, creditada, propagada, reproduzida, acreditada e impregnada ao saber científico da História da Ciência. Tanto desempenho somente é possível encontrar no uso de fake news nas redes sociais atualmente.

Como acontece quando uma fake news cumpre seu ciclo de forma plenamente satisfatória, o nome João Calvino percorreu o século XX entre filósofos, historiadores da ciência e cientistas como opositor da ciência e que qualquer informação sobre ele não necessita de constatação de sua veracidade, mas é devido repassar ao máximo de pessoas, como forma de penalizá-lo pela maculação por sua perseguição à ciência e cientistas.

Cientificamente caluniado por fake news. Cientificamente castigado por cientistas sem investigação científica. Cientificamente considerado inocente, mas fadado ao fake news do preconceito intencional científico.

João Calvino se opôs à ciência. É fake! Ele era tirano em Genebra. É fake!

João Calvino amava a Palavra de Deus, pastoreou com sinceridade e contribuiu com a sociedade ocidental com os valores mais necessários ao bem-social: democracia, educação para todos, representatividade política e vida piedosa. É verdade, sim, é tudo verdade! 

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Referência Bibliográfica

HOOYKAAS, Reijer. A religião e o desenvolvimento da ciência moderna. Brasília: Editora Polis/UnB, 1988.
STAUFFER, Richard. Calvin et Copernic. Disponível em: https://www.persee.fr/doc/rhr_0035-1423_1971_num_179_1_9663.
WHITE, Andrew Dickson. A History of the Warfare of Science with Theology in Christendom. New York and London: D. Appleton and Company, 1910. Vol. I.
RUSSELL, Bertrand. História da filosofia ocidental – Vol. 3. 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967.
ROSEN, Edward Rosen. Calvin's Attitude Toward Copernicus. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/2708147.
KUHN, Thomas. A revolução copernicana. Lisboa: Edições 70, 1990.

* Texto extraído de: GUIMARÃES, J. A. L. O berço da ciência moderna no pensamento de João Calvino. São Paulo: Amazon/Kindle.

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