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COMENTÁRIO DE CALVINO AO EVANGELHO DE MATEUS 4.4

“Jesus, porém, respondeu: Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus” — Mateus 4.4.

“Nem só de pão viverá o homem”: Ele cita a declaração de que o ser humano não vive somente de pão [Dt. 8.3], mas pela secreta bênção de Deus. Disso, pois, concluímos que Satanás fez um ataque direto à fé de Cristo, na esperança de que, após destruir sua fé, o levaria a métodos ilícitos e perversos de obtenção de alimentos. E, certamente, ele nos pressiona muito, quando tenta nos fazer desconfiar de Deus e buscar nosso próprio benefício de uma forma não autorizada por sua Palavra. O significado das palavras, portanto, é: “Quando você vê que foi abandonado por Deus, é impelido pela necessidade a cuidar de si mesmo. Proveja, então, para si mesmo o alimento com o qual Deus não lhe fornece.”
Portanto, embora considere o poder divino de Cristo para transformar as pedras em pães, no entanto, o único objetivo que ele tinha em vista era persuadi-lo a se afastar da palavra de Deus e seguir os ditames da infidelidade. A resposta de Cristo, consequentemente, é apropriada: “Nem só de pão viverá o homem. Você me aconselha a inventar algum remédio para obter alívio de um modo diferente daquele que Deus permite. Isso seria desconfiar dele. E não tenho motivo para esperar que ele me apoie de uma maneira diferente da que prometeu em sua Palavra. Você, Satanás, apresenta o favor dele como limitado ao pão. Mas ele mesmo declara que, embora estivesse faltando todo tipo de alimento, somente a sua bênção é suficiente à nossa nutrição.”
Tal foi o tipo de tentação que Satanás empregou, o mesmo com o qual ele nos ataca diariamente. O Filho de Deus não escolheu empreender nenhuma disputa de natureza incomum, mas suportar ataques em comum conosco, para que pudéssemos ser equipados com a mesma armadura e não tivéssemos dúvidas quanto à obtenção da vitória.
“Está escrito: Nem só de pão viverá o homem”: a primeira coisa a ser observada aqui é que Cristo usa as Escrituras como seu escudo. Porque esta é a verdadeira maneira de lutar, se quisermos ter certeza da vitória. Com razão, Paulo diz que a espada do Espírito é a palavra de Deus e nos ordena a “tomar o escudo da fé” [Ef. 6.16]. Portanto, também concluímos que os papistas, como se tivessem feito um acordo com Satanás, entregam cruelmente as almas para serem destruídas por ele a seu bel-prazer, quando perversamente ocultam as Escrituras do povo de Deus e, assim, os privam de suas armas: pelas quais, unicamente, sua segurança poderia ser preservada. Aqueles que voluntariamente abandonam essa armadura e não se exercitam laboriosamente na escola de Deus, merecem ser estrangulados a todo instante por Satanás, em cujas mãos se entregam desarmados. Nenhuma outra razão pode ser atribuída à fúria de Satanás, que encontra tão pouca resistência, e o motivo pelo qual tantos são levados em todos os lugares por ele, senão pelo fato de Deus punir a negligência deles e seu desprezo por sua palavra.
Devemos, agora, examinar mais de perto a passagem de Moisés, que é citada por Cristo: “...para te dar a entender que não só de pão viverá o homem, mas de tudo o que procede da boca do Senhor viverá o homem” [Dt. 8.3]. Há quem a distorça com um significado falso, como se referindo à vida espiritual: como se nosso Senhor tivesse dito que as almas não são nutridas pelo pão visível, mas pela palavra de Deus. Sem dúvida, a afirmação em si é verdadeira. No entanto, Moisés tinha um significado bem diferente. Ele os lembra que, quando nenhum pão podia ser obtido, Deus lhes forneceu um tipo extraordinário de alimento, no “maná, que tu não conhecias, nem teus pais o conheciam” [Dt. 8.3] e que isso pretendia ser uma prova evidente, em todos os tempos vindouros, de que a vida do homem não se limita ao pão, mas depende da vontade e do beneplácito de Deus. A palavra não significa doutrina, mas o propósito que Deus tornou conhecido, com relação à preservação da ordem da natureza e da vida de suas criaturas. Tendo criado o ser humano, ele não deixa de cuidar dele: como “lhe soprou nas narinas o fôlego de vida” [Gn 2.7], assim ele preserva constantemente a vida que concedeu. Semelhantemente, o Apóstolo diz que ele sustenta “todas as coisas pela palavra do seu poder” [Hb. 1.3], ou seja: o mundo inteiro é preservado e cada parte dele é mantido em seu lugar pela vontade e decreto dele, cujo poder, acima e abaixo, está difundido em toda parte. Embora vivamos de pão, não devemos atribuir o sustento da vida ao poder do pão, mas à bondade secreta, pela qual Deus concede ao pão a qualidade de nutrir nossos corpos.
Daí, também, segue a outra declaração: “...de tudo o que procede da boca do Senhor viverá o homem”. Deus, que agora emprega o pão para nosso sustento, nos permitirá, sempre que quiser, que vivamos por outros meios. Esta declaração de Moisés condena a estupidez daqueles que consideram que a vida consiste em luxo e abundância; enquanto reprova a desconfiança e a ansiedade desordenada, que nos levam a buscar meios ilícitos. O objetivo preciso da resposta de Cristo é este: devemos confiar em Deus para o alimento e para as demais necessidades da presente vida, de tal maneira que nenhum de nós ultrapasse os limites que ele prescreveu. Ora, se Cristo não se considerava livre para transformar pedras em pães sem a ordem de Deus, muito menos nos é lícito obter alimentos por fraude, roubo, violência ou assassinato.
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